DLBC – Desenvolvimento Local de Base Comunitária
EDL – Estratégia(s) de Desenvolvimento Local
GAL – Grupo(s) de Ação Local
PDR – Plano de Desenvolvimento Regional
PO – Programa(s) Operacional(is)
Introdução | 9
Introdução
Nas avaliações do Eurobarómetro, emitidas na Primavera e no Outono,
os níveis de confiança dos cidadãos europeus e particularmente dos portugueses
em relação às instituições europeias no período que medeia
entre 2010 e 2015, sofreram uma quebra acentuada. As medidas de austeridade
terão contribuído para esse sentimento de progressivo afastamento
dos cidadãos do projeto europeu, mas desde há muito que o denominado
défice democrático é apontado como um fator crítico no funcionamento
e formação da decisão das instituições europeias (Hennette,
Stéphanie, Piketty, Thomas, Sacriste, Guillaume, Vauchez, Antoine, 2017:
11-17). Este sintoma está inscrito em diversos textos relativos a um passado
recente e também sobre o presente europeu, mas também na relativa
perda de participação eleitoral nas eleições para o Parlamento Europeu.
Eleitores Votantes Percent. Abstenção Percent.
19/06/1987 7787603 5639650 72,42% 2147953 27,58%
18/06/1989 8121564 4149756 51,10% 3971808 48,90%
12/06/1994 8565822 3044001 35,54% 5521821 64,46%
13/06/1999 8681854 3467085 39,93% 5214769 60,07%
13/06/2004 8821456 3404782 38,60% 5416674 61,40%
07/06/2009 9704559 3568943 36,78% 6135616 63,22%
25/05/2014 9702657 3283610 33,84% 6419047 66,16%
Quadro 1 – Participação eleitoral dos portugueses nas Eleições
para o Parlamento Europeu – 1987-2014
10 | GRUPOS DE AÇÃO LOCAL
Ora, esta conjugação de fatores deve levar-nos a refletir sobre os modelos
de organização e funcionamento institucional que melhor podem
garantir a participação e mobilização dos cidadãos e dos seus representantes
na construção das soluções de desenvolvimento social, económico
e territorial. Tem sido essa uma das preocupações dos teóricos do desenvolvimento
territorial e dos decisores políticos comprometidos com a
coesão nas suas múltiplas dimensões.
Como é que os cidadãos comunicam com quem está nos lugares de
decisão? Como é que quem está nos centros de decisão – elites democráticas
ou tecnocráticas – recebe, organiza, hierarquiza e integra os contributos dos
cidadãos e dos atores do desenvolvimento de base comunitária na formação
de uma estratégia de desenvolvimento que permita concorrer e aceder
aos fundos europeus destinados a valorizar os recursos territoriais locais?
Da teoria dos sistemas e da teoria das elites é possível extrair a noção
de que qualquer estrutura de decisão tem canais de comunicação que
permitem receber os inputs dos cidadãos e a partir da estrutura de decisão,
onde estão sediados os técnicos ou os eleitos, processar os correspondentes
outputs em resultado de um processo de feedback, que permite ao
sistema adaptar-se ou transformar-se, total ou parcialmente, em função
dos factos ou acontecimentos que ocorrem e que lhe são transmitidos.
Por ser reconhecida a necessidade de aprofundar as condições de participação
dos cidadãos no processo de decisão europeu e qualificar as políticas
de coesão social, económica e territorial, foi ampliado o poder legislativo
do Parlamento Europeu e, por iniciativa da Comissão, foram criados
o Comité das Regiões e o Comité Económico e Social, a par de outros instrumentos
destinados a reforçar a participação dos cidadãos europeus no
processo de formação da decisão. Nuns casos com funções de caráter consultivo,
noutros com funções de contribuição para a elaboração de EDL.
E se é certo que desde os primórdios do decénio de noventa as suas funções
se foram aprofundando, os dados relativos à confiança nas instituições
acima referidos sofreram uma queda significativa no período assinalado.
As deliberações das instituições comunitárias afetam as estruturas
nacionais, regionais e locais, por via dos regulamentos, diretivas e
Introdução | 11
decisões, mas também ocorre que os territórios locais têm instrumentos
de participação na elaboração e aplicação das estratégias de desenvolvimento.
Ora, o ensaio que aqui propomos tem o objetivo de iniciar
uma aproximação ao estudo do modo como os atores locais, públicos e
privados, são considerados no processo de elaboração das estratégias de
desenvolvimento local, tendo por universo de análise os GAL1 responsáveis
pelas denominadas DLBC, que enquadram formal e institucionalmente
a aplicação de fundos comunitários destinados a promover a coesão
social, económica e territorial nos espaços rurais e de baixa densidade
populacional.
Procuramos detetar o método de conceção da EDL e perceber como
funcionam os canais de comunicação entre os cidadãos e os atores locais
com as estruturas de decisão e como é que, por sua via, essas instâncias
locais de organização e de poder estabelecem as suas relações com as instituições
europeias relativas à coesão territorial, numa abordagem bottom-
up. Observar e descrever o modo como as prioridades de desenvolvimento
construídas com base na auscultação dos atores locais são levadas
aos atores de nível hierárquico superior.
Nesta aproximação, procuramos verificar como é que o GAL – típica
estrutura cuja origem está relacionada com a sociedade civil – responsável
pelo estabelecimento e aplicação de uma estratégia de DLBC no denominado
território “Douro Verde” (Amarante, Baião, Marco de Canaveses,
Cinfães, Resende e uma parte de Penafiel) integra os atores locais, públicos
e privados, na conceção da EDL e como é que essa estratégia é agregada
às prioridades de investimento europeu destinado a promover a coesão
social, económica e territorial.
Os níveis de confiança dos cidadãos nas suas instituições locais, regionais,
nacionais e europeias será tanto maior quanto maior for a sua vinculação
ao conteúdo do contrato político com elas estabelecido, quer na fase
da sua conceção, quer no momento da sua execução e ulterior escrutínio.
A União Europeia tem-se afirmado como um projeto geopolítico e
tem vindo a construir um modelo de desenvolvimento que procura ser
competitivo, sustentado ambientalmente e coeso do ponto de vista social,
12 | GRUPOS DE AÇÃO LOCAL
económico e territorial. Estas são premissas assumidas no Tratado de
Lisboa, e reiteradas na Estratégia UE/2020.
também aceite que a partir do Ato Único Europeu a Europa deu um
passo decisivo na direção do mercado único e de uma maior união política.
Essa será a motivação para o surgimento da denominada “Europa das
Regiões”. Além da influência exercida pelos Lander alemães e por outras
regiões de países federados, como a Bélgica, a Áustria e a Espanha, a própria
Comissão percecionou nesta determinação dos estados federados alemães
uma oportunidade para estabelecer um novo canal e um outro espaço
de relação direta com os territórios locais e regionais, subtraindo com isso
alguma da influência do Conselho de Ministros. Da conjugação da vontade
dos poderes regionais e locais com este impulso da Comissão nasceu em
1988 o Conselho Consultivo das Autoridades Locais e Regionais da Europa
e, posteriormente, já com o Tratado de Maastricht, o Comité das Regiões.
Desde então, os momentos de maior exigência para a União Europeia
trazem ao debate a crise de confiança nas instituições e a necessidade do
reforço da legitimidade.
Considerando que a União Europeia é um sistema que integra vários
subsistemas, ou sistemas parciais, como ocorre com o Comité das Regiões,
procuramos verificar como é que os GAL, responsáveis pelas EDL, herdeiros
da antiga abordagem “Leader”, se afirmam como subsistemas locais
e como contribuem para o estabelecimento de uma relação de maior proximidade
dos cidadãos com as instituições parceiras dos poderes regionais
e europeus na aplicação dos fundos de coesão destinados ao desenvolvimento
local e regional.
Para melhor entendermos o modo de constituição e funcionamento
dos GAL e as estratégias de DLBC, propomo-nos recuperar alguns dos
ensinamentos da teoria geral dos sistemas e da teoria das elites, tendo
em vista melhor compreender, organizar, sistematizar e explicar o modo
como esses contributos dos atores locais, singulares e coletivos, públicos
e privados, entram num sistema de base local, composto por elites locais,
eleitas e não eleitas, e são encaminhados para os sistemas regionais e destes
para o sistema europeu.
A teoria dos sistemas | 13
C a p í t u l o I
A Teoria dos Sistemas
A Evolução do Conceito
O conceito geral de sistema ganhou importância na ciência contemporânea
e foi sendo adotado por disciplinas tão diversas como a Biologia, a
Física, a Sociologia e pela Ciência Política (Braillard, Philippe, 1977: 13)2.
Convém, no entanto, enquadrar o conceito na história e na ciência moderna
e mesmo num quadro mais largo do pensamento ocidental.
A ideia de uma totalidade, não reduzida à simples soma das suas partes
e à qual se manifesta necessário recorrer para compreender os diversos elementos
da realidade sempre esteve presente no pensamento filosófico grego
e medieval. Por exemplo, Aristóteles entendeu o cosmos como um vasto
sistema hierárquico, como uma ordem na qual cada ser participa pela sua
natureza e a qual é importante ser referida para compreender a realidade.
No entanto, a visão da realidade como um todo envolvente, será substituída,
progressivamente, pelo recurso ao estudo dos corpos isoladamente
da ordem cósmica (Braillard, Philippe, 1977: 14). Será, pois, com Galileu
que se efetuará a distinção entre o espaço concreto e o espaço da geometria,
procurando encontrar as leis válidas para as diferentes esferas da realidade
física, abandonando, assim, o princípio dos antigos segundo o qual existiam
diversas leis consoante os níveis. Passa-se da perspetiva especulativa,
sintética e holística3 para uma perspetiva empírica, analítica e atomística.
14 | GRUPOS DE AÇÃO LOCAL
Este ponto de vista tem como objeto o estudo isolado de cada um
dos elementos da realidade. Pensa-se, portanto, que será possível estudar
um objeto complexo a partir das propriedades dos seus elementos
constitutivos, sem, contudo, serem consideradas as suas interações. Este
modo de ver e analisar a realidade foi substancialmente concretizado no
modelo mecanicista que se foi progressivamente desenvolvendo na ciência
(Deutsch, Karl W., 1968: 388-389)4.
O conceito de mecanicismo implica, por consequência, a ideia de que
as partes não são modificadas umas pelas outras de modo significativo,
nem pelo seu passado e que, cada uma delas, uma vez colocada na sua
posição apropriada, no momento adequado, aí se mantém e continua a
exercer as suas funções inteiramente determinadas”5.
Este modelo pode ser encontrado nos métodos da fisiologia na qual
o processo de vida é considerado em termos de sequências de reações
químicas; ou o método da psicologia behaviorista que concebe o comportamento
como uma totalidade de “respostas aos estímulos”6; ou, ainda, a
economia clássica de mercado, que descreve o processo económico como
uma totalidade de ações individuais que são motivadas para comprar ou
vender de acordo com as flutuações da oferta e da procura, no entendimento
do denominado pai da economia moderna e um dos maiores teorizadores
do liberalismo económico, Adam Smith7. Estas situações são
reconhecidas e sistematizadas por Anatol Rapoport (1911-2007)8.
Do Atomismo à Perspetiva Sistémica
Porém, pouco a pouco, a perspetiva atomista deixou de poder dar resposta
ao conjunto das relações mais profundas e mais complexas9, sobretudo
aquelas que diziam respeito ao estudo de mais de dois corpos. A
estrutura atómica da matéria e a organização dos seres vivos não podia ser
apenas explicada pela soma dos seus elementos ou componentes. Daí que
tenha sido necessário o recurso a princípios que não derivavam somente
das ciências naturais para explicar os fenómenos vitais.
A teoria dos sistemas | 15
A partir desta evolução, a ideia de que o conceito de organismo deveria
ser analisado como um todo que não se pode reduzir no plano explicativo
a uma série de elementos começou a cristalizar-se. Desta forma,
um determinado grupo de investigadores começou a abandonar a perspetiva
atomista e a orientar-se no sentido da caminhada holística. Esta
tendência holística, que se desenvolve fortemente a partir do início do
século XX não atuou apenas na Biologia mas também nos outros ramos
do saber, como na Psicologia e na própria Sociologia. Exemplo disso é o
trabalho de Émille Durkeim (1858-1917), considerado um dos principais
fundadores das Ciências Sociais. Nascido em França, influenciado pelo
Positivismo de Augusto Comte, dedicou o seu trabalho intelectual a elaborar
uma ciência que possibilitasse o entendimento dos comportamentos
coletivos. O seu grande objeto era o de explicar os elementos capazes
de manter coesa a sociedade que emergia da Revolução Industrial e da
Revolução Francesa. É ele que vai determinar o “facto social” como objeto
central do novo campo científico. Segundo ele, o “facto social”, observável,
definido e explicável pelo cientista social, provém da sociedade, impõe-se
ao indivíduo e acaba por determinar os seus comportamentos.
Contudo, esta tendência holística e organicista começou a sentir dificuldades
semelhantes às correntes anteriores, sobretudo à medida que
fazia recurso a uma explicação do tipo teleológico10.
Por essa razão, no período entre as duas guerras, entendeu-se que os
fenómenos complexos, como o da vida, deveriam ser vistos como manifestando
“complexidades organizadas”. No fundo, passa a existir a ideia de
que o próprio fenómeno da vida é um sistema cuja explicação apenas pode
emergir pelo recurso à consideração de totalidade e organização; organização
essa manifestada pelas interações múltiplas dos elementos constitutivos
dessa totalidade (Braillard, Phillipe, 16). A propósito desta ideia de
“complexidade”, Adriano Moreira, inspirado em Teilhard de Chardin, teorizou
sobre a Lei da Complexidade Crescente, caracterizada por “sopros”
de convergência e de divergência, impondo uma leitura da realidade mais
complexa e procurando um qualquer tipo de sistematização11.
16 | GRUPOS DE AÇÃO LOCAL
A Ideia de Sistema e a Ciência Contemporânea
A Biologia, sobretudo devido às controvérsias que analisámos, afirmou-
se como a ciência mais aberta à ideia de sistema. Foi Ludwig von
Bertalanffy, que esteve mais largamente envolvido na adoção e desenvolvimento
do conceito de sistema. Desde 1925 que este autor procurou
compreender a realidade viva como um sistema organizado, como uma
totalidade não redutível à soma dos seus elementos.
Assim, grande parte das ciências contemporâneas tem recorrido a
esta perspetiva sistémica, como sejam a Física e a Matemática; o mesmo
tem sucedido com as Ciências Cumanas, v.g. a Economia e a Linguística
(Braillard, Phillipe, 17). Porém, a sua influência tem-se mostrado decisiva
no domínio da Ciência Política e da Sociologia. Por exemplo, Talcott
Parsons (1902-1979) viu a sociedade como “uma totalidade sistémica, da
qual as partes ou subsistemas, com os processos que lhes são próprios,
devem estar em equilíbrio uns relativamente aos outros para que o sistema
seja viável” (idem, 18). Talcott Parsons dá um novo significado ao
behaviorismo considerando que toda a ação humana “é interação”, relação
entre um determinado agente e o ambiente que o cerca, constituindo
uma resposta a um determinado estímulo exterior” (Maltez, Adelino, p.
89). Parsons considerará a sociedade como um “Sistema Social que é
caracterizado pelo mais elevado nível de auto-suficiência em relação ao
seu ambiente e que consistiria numa pluralidade de atores individuais em
interação uns com os outros” (Maltez, Adelino, p. 89).
Segundo Parsons, o Sistema Social tem quatro importantes funções,
duas delas voltadas para a sua relação com o meio ambiente exterior e
outras duas para as relações internas do respetivo Sistema. A primeira
função é a considerada adaptação e corresponde ao subsistema biológico.
Trata-se da adaptação do Sistema Social ao meio ambiente onde vive,
tendo em vista recolher recursos, armazená-los em função das necessidades
e, como contrapartida, contribuir para o meio ambiente com produtos
próprios. A segunda está relacionada com o “alcançar objetivos” e corresponde
à personalidade psíquica. Ou seja, um Sistema Social, para viver
A teoria dos sistemas | 17
em equilíbrio interno e externo, teria de alcançar uma série de objetivos e
de finalidades. Trata-se de prosseguir determinados fins (Maltez, Adelino,
p. 89). A terceira função é a da integração. Esta função tem um caráter
interno e procura garantir a integração de todas as tendências que correm
o risco de marginalização ou de serem colocadas fora do Sistema. Em
quarto lugar, temos a função que procura conservar e manter os modelos
culturais. Corresponde ao subsistema da cultura e visa superar os eventuais
conflitos (Maltez, Adelino, p. 89).
No que diz respeito à análise politológica, o conceito de Sistema
desempenha um papel fundamental. Nomes como Gabriel Almond e G.
B. Powell ou J. Coleman consagraram os seus estudos a uma aproximação
teórica estrutural e funcional do desenvolvimento político, ou seja,
da passagem de um sistema político tradicional a um sistema político
moderno. Por exemplo, Almond, nesta aproximação teórica do desenvolvimento,
tenta estabelecer uma tipologia dos sistemas políticos, em
função da sua eficácia no exercício das funções que cabem a todo o sistema
político (idem, 19).
Com efeito, nos últimos decénios, a adoção por parte das várias ciências
do conceito de sistema, distanciando-se, paralelamente, da perspetiva
atomista, têm contribuído para o desenvolvimento do conceito de
Sistema. É, por exemplo, o caso da Cibernética, cuja origem remonta aos
trabalhos de Norbert Wiener (1948: 8-194)12, tendo dedicado a sua obra
ao estudo dos processos de comunicação e à sua regulação no interior do
Sistema (Maltez, Adelino, p. 90-91).
Como considera Edgar Morin13, “tous les objets clés de la physique, de
la biologie, de la sociologie, de l’astronomie, atomes, molecules, cellules,
organismes, sociétés, astres, galaxies constituent des systèmes” (Morin,
Edgar, 99). E continua afirmando “Notre monde organisé est un archipel
de systèmes dans l’océan du désordre” (Morin, Edgar, p. 99-105).
É na denominada terceira geração da ciência política norte-americana
que aparecem David Easton, Robert Dahl e Karl Deutsch14.
David Easton15 entende o sistema político como um Sistema de distribuição
autoritária de valores, como um conjunto de interações pelas quais
18 | GRUPOS DE AÇÃO LOCAL
se efetua a distribuição (allocation) autoritária (authoritative) de valores
para uma determinada sociedade (Easton, David, 1965: p. 25). Como refere
este autor, a vida política surge como um complexo conjunto de um processo
através do qual certo tipo de inputs são convertidos em determinados
outputs que poderemos chamar políticas “autoritárias/induzidas/orientadas”,
decisões e ações a implementar (Easton, David, p. 17). Seria este
processo de natureza funcional da atribuição e distribuição de valores, de
objetos valorizados pelo mesmo Sistema, distribuição marcada pela autoridade
e pela imperatividade, que constituiria o traço distintivo do Sistema
Político. Com esta perspetiva sistémica, a Ciência Política volta a ganhar
alguma autonomia em relação à sociologia. Será por esta perspetiva funcionalista
que regressam os temas dos valores e da autoridade. Parte-se da
noção de que a vida política incorpora uma unidade mais inclusiva.
No seguimento do behaviorismo e de Parsons, David Easton tem no
centro da sua análise a ideia de ambiente considerando que o Sistema
Político é um sistema de comportamentos que, por um lado, é influenciado
pelo ambiente onde se insere e, por outro, responde ou reage a esse
ambiente (Maltez, Adelino, p. 92). O ambiente interior seria o da sociedade
global entendida como o Sistema Político enquanto unidade integradora
do Sistema Ecológico, do Sistema Biológico, do Sistema Psicológico
e, ainda, dos Sistemas Sociais, incluindo nestes o Sistema Cultural, a
Estrutura Social, o Sistema Económico, o Sistema Demográfico e outros
subsistemas. O ambiente exterior seria o ambiente que circunda a sociedade
global, composto por três elementos: o sistema político internacional;
os sistemas ecológicos internacionais e os sistemas sociais internacionais.
O ambiente total do Sistema Político seria, pois, a soma do ambiente
interior com o ambiente exterior (Maltez, Adelino, p. 92).
O Sistema Político funcionaria como uma caixa negra produtora de
decisões e de ações (outputs) que teria como entradas, como inputs tanto
as exigências (demands) como os apoios (support). O que daqui resulta é
que o sistema está em permanente processamento, na medida em que os
outputs têm influência sobre a natureza dos inputs e estes sobre os novos
processamentos e de novo outputs.
A teoria dos sistemas | 19
O apoio tanto pode ser específico como difuso, o que significa que A
pode apoiar diretamente B ou manifestar uma orientação favorável a B. O
B pode ser uma pessoa, um grupo, um fim, uma ideia ou uma instituição
(Maltez, Adelino, p. 92, apud Easton, David, p. 159). A exigência exprime
as designadas necessidades sociais (wants) refletindo a insatisfação de certos
membros da sociedade (Maltez, Adelino, p. 92). David Easton, citado
por Maltez (op. cit., p. 92), define a exigência como “a expressão da opinião
que uma atribuição dotada de autoridade, respeitante a um domínio
particular, deve ou não ser feita pelos que para tal são encarregados”
(Easton, David, p. 159)16. Poderíamos daqui retirar que se trata da representação
política.
Dentro da caixa negra do Sistema, far-se-ia a retroação da informação,
a conversão das exigências em outputs, através das chamadas autoridades.
Pela retroação, o sistema político pode ajustar a sua atividade tendo em
conta os resultados da sua atividade passada. A retroação aparece como
um conjunto de processos que permite ao Sistema controlar e regularizar
as perturbações que se façam sentir, e regressar ao estado de equilíbrio
(Maltez, Adelino, 92).
Ambiente
Input Interior Output
Ambiente
Exterior
20 | GRUPOS DE AÇÃO LOCAL
Importa, agora, atentar no que nos diz o professor de Harvard Karl
Deutsch, no The Nerves of Government. Models of Political Communication
and Control (1963). Para Deutsch, o Sistema Político é equiparável a um
sistema nervoso, a um sistema de ligação de centros nervosos que são
irrigados pela informação. Um sistema dotado de sensores que captam a
informação que, depois de transportada para os centros nevrálgicos do
sistema é selecionada e se transforma em decisões. Por outro lado, compara
o Sistema Político a um sistema de pilotagem, como um processo
que tem em vista a obtenção de determinados fins, a condução da nau do
Estado a um determinado porto, falando-se na política como um Sistema
de pilotagem do futuro.
O início do processo está nos recetores de dados e de mensagens, nos
centros de receção de informação, nos pontos de entrada da informação
proveniente do ambiente interno e externo, o equivalente ao que David
Easton considerava como os porteiros (gatekeeper). Os centros recetores
comunicam a informação aos centros de processamento de dados, locais
onde também se recebem os inputs sobre o próprio funcionamento do
Sistema. Os centros de processamento de dados passam de seguida a informação
tanto aos centros de decisão como ao centro de armazenamento,
local do Sistema onde funciona a memória e os valores. A memória é o
sítio do Sistema onde se armazena a informação e onde os valores permitem
confrontar as possibilidades de execução com as preferências.
É neste momento que se confrontam as mensagens do presente com as
informações recebidas do passado. Forma-se nestes termos a individualidade
e a autonomia de um sistema, atribuindo-lhe identidade. Ou seja,
permitindo que surja um povo, entendido por Deutsch como uma comunidade
de significações partilhadas, e gerando a autonomia, o que significa
que o Sistema consegue usar a informação do passado para decidir
no presente (Maltez, Adelino, p. 93-94).
É a partir desta repartição e exaltação de símbolos de uma comunidade,
podendo ser uma instituição, que vai teorizar-se a socialização política e
a educação política tendo em vista garantir a comunicação de mensagens,
evitando o que Durkheim qualificou como anomia, ou seja, a existência
A teoria dos sistemas | 21
de um grande número de pessoas que não sabem que regras seguir no seu
comportamento social. Num terceiro momento do processo temos o centro
de decisão que recebe informação de dois centros: do centro de processamento
de dados e do centro de memória e valores. Surge aqui a retroação
da informação, o denominado feedback, uma vez que a decisão do presente
é sempre o resultado da soma do ambiente com a memória. A decisão é preparada
na central da consciência do Sistema. Este é o local onde ocorre o
processamento de resumos simplificados, preparados/selecionados previamente
pelos centros de receção de dados. É nestes centros que ocorre a inspeção
e a coordenação preparando-se a decisão. No quarto momento, temos
as implementation orders, ou seja, depois da decisão temos as estruturas que
produzem as decisões. Que dão corpo formal às mesmas e as implementam.
Governar assemelha-se, assim, à pilotagem de um navio, dado que na
política interna ou externa se caminha para um objetivo e para o alcançar
é necessário ajustar permanentemente a decisão em função da informação
recebida e processada de acordo com um histórico.
Governar equivale a pilotar, a conduzir um navio para um determinado
porto. Assim como pilotar um navio é confrontar constantemente
a respetiva posição com a prévia rota estabelecida, determinando-se a
distância que o separa do porto de chegada, assim governar é confrontar
um fim com a execução de um programa. O ponto essencial da tese de
Deutsch é o que ele qualifica como feedback negativo, ou seja, as informações
sobre o próprio estado dos Sistema que levam o mesmo a reagir
às suas próprias transformações. As informações sobre as consequências
das decisões e das ações voltam ao Sistema, de modo a surgir um controlo
da ação com base nos erros do passado. Este autor faz uma comparação
com os termóstatos que reagem a uma elevação anormal da temperatura
cortando a energia ao próprio Sistema, retomando-a depois quando se
volta à normalidade. O feedback negativo leva a que o Sistema disponha
de dois tipos de informações: as informações externas, que são informações
da relação do ambiente com o Sistema; e as informações internas,
que são as informações sobre o próprio estado do Sistema. E neste caso
haveria que atender a quatro varáveis:
22 | GRUPOS DE AÇÃO LOCAL
a) Ao load, ou carga, ao peso da informação recebida no Sistema;
b) Ao lag, o atraso ou demora do Sistema a executar a adaptação em
função da informação recebida e do processamento da mesma;
c) Ao gain, ao ganho, que significa os ganhos de tempo com as modificações
ao comportamento empreendidas, o mesmo é dizer à
capacidade de reação do Sistema político aos novos dados de que
se teve conhecimento;
d) Ao lead, ao adiantamento, à distância entre a posição corretamente
prevista do alvo móvel e a posição real donde os últimos
sinais foram recebidos.
Como considera o autor, as probabilidades de êxito na procura de
objetivos estão sempre inversamente relacionadas com a quantidade de
load e lag. Até um determinado ponto podem relacionar-se de forma positiva
com as quantidades de gain, mas em elevados níveis de gain a posição
pode inverter-se e sempre se relacionam positivamente com a quantidade
de lead (Deutsch, Karl, p. 187-190, Maltez, Adelino, p. 94-95).
Efetivamente, podemos notar que o conceito de sistema atualmente
se tornou imprescindível do ponto de vista das ciências aplicadas, da tecnologia
(Braillard, Phillipe, 21), do estudo da ciência política e das relações
internacionais.
Como se pode extrair da teoria dos sistemas, o conjunto dos elementos/
atores, podendo ter uma natureza social, cultural, económica ou política,
mais as suas relações formam uma totalidade complexa. Esta totalidade
tem uma estrutura e uma determinada organização. Uma hierarquia.
A sua estrutura pode ser dinâmica e ajustada a um determinado
ambiente interno e externo. A mesma tem mecanismos de comunicação
entre e com os elementos internos e externos. Os elementos internos
podem ser os membros associados de uma dada instituição, os seus
corpos sociais, formados por elites eleitas e elites não eleitas, cuja autoridade
reside na competência técnica ou na legitimidade democrática. Essa totalidade,
composta por elementos internos e por elementos externos, interage
com um ambiente global, no caso das DLBC trata-se de um ambiente
regional, nacional e europeu.
A teoria dos sistemas | 23
Importa, agora, atender a uma outra teoria explicativa das mudanças
sociais e das mudanças no interior e no exterior das instituições.
Referimo-nos à teoria das elites. Com efeito, os sistemas sociais, culturais,
económicos e políticos são feitos de pessoas e por pessoas. Entre
estas, estão aqueles e aquelas que, pelas funções que lhes estão confiadas,
têm especiais responsabilidades no processo de representação política. A
teoria das elites procura apresentar um modelo explicativo da dinâmica e
mobilização social a partir dos que têm funções de decisão ou de influência.
Na medida em que, como acima se afirmou, os inputs têm origem nos
indivíduos e nos grupos de interesses e as decisões são tomadas por círculos
de decisão após um longo processo de retroação, conhecer a teoria das
elites e articulá-la com a teoria dos sistemas dá-nos um quadro de análise
importante e que nos ajudará a explicar o modo como os atores locais,
públicos e privados, e numa ótica de governo a vários níveis, vertical e
horizontal, contribuem para a definição de uma estratégia de desenvolvimento
que suportará o acordo de parceria com as entidades regionais
e destas com as entidades nacionais e europeias com vista à aplicação dos
fundos destinados ao desenvolvimento regional e local.
Reiteramos que a aplicação destas duas propostas teóricas como mecanismo
de entendimento do processo de participação dos cidadãos e dos
atores locais num processo de decisão de candidatura, aplicação e avaliação
dos efeitos dos fundos comunitários nas políticas de coesão, por intermédio
dos GAL, pretende ilustrar que há métodos de trabalho democrático
que podem contribuir para o restabelecimento de níveis superiores
de confiança nas instituições. Vejamos a teoria das elites e, muito particularmente,
a sua relação com a dinâmica social.
A teoria das elites | 25
C a p í t u l o I I
A Teoria das Elites
A Noção de Elite
Se tivermos em consideração uma definição enciclopédica, o termo
elite traduz aquilo “que há de melhor numa sociedade ou num grupo”17.
Há também quem entenda a elite como “os escolhidos da sociedade, a
sua aristocracia intelectual impulsionadora, segundo uns, de todo o progresso
social ou, segundo outros, simples detentora das melhores qualidades
latentes no corpo social”18.
Efectivamente, desde a Antiguidade19 que vários autores se têm dedicado
ao estudo da elite, designando-a de “nata”, “chefes”, “guias” por se
tratarem dos “melhores” elementos das distintas civilizações humanas
(Gonçalves, José Júlio, 1961: 46)20.
Para S. F. Nadel, o termo elite pode dizer respeito a três realidades:
a) em primeiro lugar, quando a superioridade reside na aquisição de
certas técnicas ou competências;
b) em segundo lugar, sempre que a notoriedade é de origem tradicional,
não supondo necessariamente a existência de talentos especiais;
c) por último, quando existe uma reserva de competências e de
talentos de toda a natureza (Nadel, S. F., 1956: 419-431).
Para Adriano Moreira as elites são “os grupos minoritários ou maioritários
que se tenham revelado como uma força assimiladora, isto é,
26 | GRUPOS DE AÇÃO LOCAL
como fontes de divulgação de modelos de conduta socialmente relevantes”
(Moreira, Adriano, 1963: 37)21.
Se por volta do século XVII a palavra elite pretendia alegadamente traduzir
esferas de qualidade, posteriormente seria utilizada para identificar
os grupos sociais mais elevados na escala social (Beyme, K. v., 1977:
351)22. Com efeito, o conceito não pretenderá significar a detenção de
meios de coação por parte de um grupo social restrito mas de um grupo
que produz modelos de conduta que influenciaram a evolução da sociedade
civil e do Estado (Moreira, Adriano, 1993: 240)23.
Do ponto de vista político, a elite apareceu não só como a detenção do
poder por parte de um grupo minoritário, como também pela detenção
desse poder pelos melhores, o que, aliás, se pode depreender da abordagem
do governo de sábios por parte de Platão bem como do conceito de
Saint-Simon. No entanto, “a filiação da teoria elitista em Maquiavel levou
a formulá-la em termos completamente amorais” (Moreira, Adriano,
1993: 240)24.
Maquiavel concebia a Política como uma arte de grupos dirigentes em
conflito e como tal não a entendia como um problema de massas. A solução
dos contenciosos dos grupos dirigentes em conflito resolver-se-iam
não pelo método do Direito mas sim pelo uso da força.
Também nesta linha, James Burnham, defendeu que o “elitismo” compreendia
as seguintes teses: todos os processos sociais traduzem um conflito
entre massas e elites; o objetivo da elite é o de manter o poder, usando
a violência e o engano, com pouco lugar para a ética e a coerência (Klaus
v. Beyme, 352).
A Emergência do Tema da Elite
As correntes elitistas assentam grandemente na convicção de que não
são as variáveis económicas aquelas que determinam o processo social.
Para estas correntes o motor do processo social está na vontade de poder,
de que falava Nietzsche e no incansável desejo do poder que referia Thomas
A teoria das elites | 27
Hobbes. Daí que o ressurgimento das teorias elitistas apareça como uma
reação contra a dialética marxista. Por isso, há quem veja na afirmação
de Vilfredo Pareto – a História é um cemitério de aristocracias –, a reação
contra o Manifesto Comunista no qual a História até ao presente é a história
da luta de classes (Moreira, Adriano, 1993: 240)25.
Esta ação da dialética materialista e a reação das correntes elitistas
demonstram, em primeiro lugar, que o debate é polémico. Como afirma
Wright Mills, “muitos não acreditam na existência da elite ou pelo menos
que esta possa ter consequências” (1966: 5)26. Talvez por esta razão é que
se possa dizer que “foi a contragosto que o tema da minoria se impôs no
panorama académico, o que equivale a afirmar que foi necessária uma
importante dose de evidência empírica para que os mais renitentes concedessem
discutir o problema” (Bessa, António Marques, 16).
Até à Segunda Guerra Mundial, a doutrina assentou fundamentalmente
em três grandes correntes:
a) a corrente psicológica de Pareto;
b) a perspetiva organizacional de Gaetano Mosca e Robert Michels e,
c) a perspetiva económica de Burnham.
Vilfredo Pareto (1842-1923) iniciou a abordagem da temática com um
estudo de 1901, reeditado em 1968 sob o título The Rise and Fall of the
Elites27, sendo da sua responsabilidade, como nota Guy Rocher28, a inserção
do termo e da noção de elite em Sociologia. Pareto, no seu Tratado de
Sociologia Geral, reage contra a tese marxista de luta de classes e adianta a
ideia de que a história se fundamenta numa circulação de elites. Para ele,
a sociedade deve ser analisada segundo a distinção entre massa e elite.
Deverá ser esta última a dar caráter ao corpo político. Na referida obra
considera que “a noção principal do termo elite é de superioridade. Em
sentido amplo, entendo por elite de uma sociedade as pessoas que possuem
em grau elevado as qualidades de inteligência, de caráter, de perícia,
de capacidade de todas as espécies”29.
Segundo Pareto, esta elite pode dividir-se em duas: aquela que participa
diretamente ou indiretamente no poder à qual ele dá a designação
de elite governamental e aquela que não participa no exercício do
28 | GRUPOS DE AÇÃO LOCAL
poder, denominada elite não governamental. Toda a mudança social é feita
de acordo com a renovação contínua das elites, que se esgotam e diluem,
processo que é possibilitado pelo fornecimento de novas elites provenientes
dos diferentes estratos da sociedade. Pareto, nesta sua conceção de circulação
das elites, considera essa mobilidade benéfica uma vez que, para
além de permitir a ascensão de novas forças sociais ao exercício do poder,
restabelece os necessários equilíbrios sociais30. Esta constante substituição
das elites antigas por novas elites, para além de assegurar o equilíbrio
do sistema social, por garantir a mobilidade dos “espíritos superiores”31,
concorre também para a mudança social, uma vez que este movimento
impõe uma natural circulação das ideias.
Esta abertura das elites à renovação é também entendida como salutar
porque ao possibilitar a circulação pacífica dos indivíduos vai inviabilizando
a revolução violenta que, em última instância, levará não só à destruição
do círculo exterior ao núcleo do poder, como também, e posteriormente,
poderá conduzir ao aniquilamento do seu interior. Além desta
necessidade de manter a abertura à penetração de novas elites, Pareto
chama a atenção para a importância de a elite manter a vontade do poder,
pois considera que “toda a elite que não está disposta a travar a batalha
para defender as suas posições está em plena decadência; não lhe resta
mais do que deixar o lugar a outra elite, que tenha as qualidades reais que
lhe faltam”32.
Apesar de se considerar que se encontra na linha de pensamento de
Pareto, Wright Mills estabelece, na sua obra The Power Elite33, uma profunda
distinção entre elite e classe. Para ele, é perfeitamente possível identificar
elites de classe, como, por exemplo, a elite da classe operária ou da
classe camponesa.
Na obra referenciada, Mills efetuou um estudo empírico acerca da elite
do poder nos Estados Unidos. Não formando uma classe, no sentido que
lhe era atribuído por Gaetano Mosca, as elites associam-se para formar
uma unidade de poder que domina a sociedade. Isto significa, em última
análise, que entre a elite dominante se comunga, pelo menos, do interesse
da manutenção do statu quo34.
A teoria das elites | 29
Mas, para além da comunidade de interesses entre os vários grandes
grupos ou instituições, existe uma comunidade de natureza pessoal
ou psicológica: semelhança de ideias e de mentalidades, o que se poderá
explicar pela partilha das mesmas origens sociais, da mesma educação,
dos laços de amizade, laços de parentesco, trocas de favores, entre outros
vínculos. Estes laços pessoais suportam e reforçam a comunidade de interesses
entre as elites35.
Numa mesma linha de raciocínio, Gaetano Mosca (1858-1941), sustentaria
nos seus Elementi di Scienza Política (1896) ?, a impossibilidade
da participação geral no poder, assim como também é improvável
o monopólio do poder por um só homem. Deste modo, o poder apenas
poderá ser exercido por uma minoria organizada, a qual constitui uma
classe dirigente ou classe política. Esta ideia está plenamente identificada
nas suas palavras: “Em todas as sociedades – desde as menos desenvolvidas
e civilizadas até às mais avançadas e poderosas – aparecem duas classes
de pessoas: uma classe que governa e uma classe que é governada. A
primeira, sempre menos numerosa, assume todas as funções públicas,
monopoliza o Poder e goza de todas as vantagens que envolve, enquanto
a segunda, a mais numerosa, é dirigida e controlada pela primeira, de uma
maneira mais ou menos legal, mais ou menos arbitrária e violenta.